Nos últimos dias, em virtude da publicação do texto “O Grande Jurista“, da autoria do professor Juliano Zaiden Benvindo, o blog Crítica Constitucional alcançou certa visibilidade no cenário nacional. Em resposta ao texto, o blogueiro Reinaldo Azevedo fez diversas insinuações quanto à natureza do trabalho desenvolvido no blog e que demandam esclarecimento.

O objetivo do presente Editorial não é convencer o nosso colega blogueiro do seu equívoco, mas prestar informações para que nossos leitores avaliem quem está com a razão. Seguimos, nessa linha, o conselho do filósofo inglês John Stuart Mill que, no ensaio Sobre a Liberdade, lançou as bases de boa parte do que entendemos ser o cerne da liberdade de expressão. Segundo o filósofo, é importante que as pessoas sejam livres para defender suas ideias – por mais absurdas que pareçam – porque somente pelo confronto e pelo debate as melhores ideias poderão se sobressair.

Segundo Reinaldo Azevedo, o artigo foi colhido em “algum blog sujo financiado por estatais”. A acusação é grave. Gravíssima. E falsa. Mentirosa! Crítica Constitucional não é, nem nunca foi ou será, financiado por qualquer empresa estatal, governo ou partido político. Este blog foi idealizado no final de 2012, quando os quatro editores – todos estudantes de pós-graduação (mestrado ou doutorado) da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília – decidiram inaugurar um espaço plural de crítica a questões ligadas ao constitucionalismo. E tudo no blog foi pago com o dinheiro do salário recebido pelos editores no exercício de suas ocupações profissionais. Não há nenhum centavo de doações externas, entidades políticas, organizações não-governamentais ou o que quer que seja. Isso pode ser percebido, por exemplo, na simplicidade do layout do blog.

Ao contrário de Reinaldo Azevedo, não temos patrocinadores. Não há uma única propaganda em todo o blog. Nós mesmos financiamos nosso trabalho e isso dá a Crítica Constitucional a autonomia e independência necessárias para cumprir sua função institucional, que pode ser lida na página “Sobre o Site“:

Crítica Constitucional é um blog organizado por estudantes da pós-graduação stricto sensu da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, que tem por objetivo discutir questões ligadas ao direito constitucional.

Mas não buscamos fazer uma abordagem tradicional. O nome do blog, Crítica Constitucional, evoca ao menos duas tradições bastante consolidadas na filosofia política, a marxista e a kantiana – o que, de certa maneira, espelha a experiência acadêmica dos autores.

A primeira dessas tradições, que mais tradicionalmente está associada ao vocábulo “crítica”, é a marxista. Esta abordagem busca revelar as contradições inerentes à estrutura social vigente para, com isso, tornar possível pensar e implementar alternativas institucionais. A tradição kantiana, por sua vez, enxerga na crítica um caminho para examinar os pressupostos normativos das instituições, o que também traz à tona a reflexão sobre a adequação da prática institucional à teoria subjacente a elas.

Evidentemente, as duas tradições abrem possibilidades bastante diversas de análise. E é precisamente esta diversidade que esse blog busca manter. Os autores têm trajetórias de pesquisa bastante diversas – passando tanto por autores mais próximos do meio jurídico, como Jürgen Habermas, Niklas Luhmann, Ronald Dworkin, Jeremy Waldron e John Rawls, entre outros, quanto por autores de outras áreas do conhecimento, como filosofia, economia, sociologia e antropologia.

Nesses termos, Crítica Constitucional é um espaço aberto para todos os que desejarem se manifestar com alguma qualidade. Seguimos a ferro e fogo o princípio de Mill, e nossos editores e autores têm independência para sustentar suas posições críticas quanto ao direito constitucional brasileiro. Tudo em Crítica Constitucional  foi pensado com esse objetivo. O termo “Crítica”, por exemplo, decorre de duas tradições opostas e relevantes na filosofia moral e política – o marxismo e o liberalismo kantiano.

A escolha dos editores também seguiu esse princípio. Temos editores liberais e editores mais ligados à sociologia – de origem marxista – da escola de Frankfurt. Temos editores religiosos e editores ateus. Temos editores “vermelhos” e “azuis”.

Os textos de nossos autores demonstram essa pluralidade. Temos a certeza, por exemplo, de que Reinaldo Azevedo teria, eventualmente, concordado com o texto publicado em novembro de 2013, no qual o editor Fábio Almeida teceu várias críticas aos regimes de Cuba e Venezuela. Em seguida, Maurício Palma efetuou críticas ao texto, mostrando sua discordância. Livre mercado das ideias é isso: um escreve, o outro lê e rebate. E o debate prossegue. Como deve ser em uma democracia.

Exatamente por isso, todas as publicações levadas a efeito no blog são pautadas pela abertura ao diálogo, para a compreensão da importância em enxergar a diferença, marca das nossas complexas sociedades plurais. É precisamente dessa postura que luta contra as concepções do direito e da política focadas na instrumentalização simplista de instituições e pessoas, que em nada contribuem ao debate, mas muito ao contrário, infantiliza-o, que o site se orienta. Pautamo-nos pelo ideal de construir um espaço de reflexão, não necessariamente acadêmica, e, apesar do curto espaço de tempo, esta já é uma tentativa reconhecida por alunos e professores.

Estamos mal acostumados no Brasil. Ainda não sabemos lidar com críticas no mundo acadêmico, político e jurídico. Creditamos a diversidade de opiniões à inimizade e à necessária exterminação do outro. Não aprendemos ainda que é possível – e, mais do que isso, preciso – ter pluralidade.

Somente a partir dessa percepção é possível travar um debate sério, em que sejam debatidas ideias e não fonte de financiamento, parentesco ou formação de quem está falando. Todo argumento lastreado em elementos extrínsecos a seu conteúdo é falacioso.

Reinaldo Azevedo acusa-nos de sermos um “blog sujo”. Mas o que é sujeira?  Sujeira é lançar acusação de que somos financiados por entes públicos. De que o professor Juliano Zaiden Benvindo, que logrou obter nota máxima em sua tese de doutoramento defendida na Alemanha e, além de outros trabalhos, já publicou livro em uma das editoras acadêmicas mais renomadas do planeta, tem suas opiniões vinculadas a um partido de que não é membro e que só as sustenta por conta de suas relações de parentesco.

Ressalte-se, ademais, que a acusação se revela contraditória na própria trajetória de Reinaldo Azevedo, pautada na defesa intransigente da liberdade de expressão. As críticas do professor foram pautadas no exercício desse direito e na liberdade de cátedra, direitos plenamente  assegurados na Constituição Federal.  A resposta de Azevedo, por outro lado, pautou-se tão-somente no recurso à falácia ad hominem, e não ao enfrentamento dialógico do conteúdo do texto.

Oferecer resposta a um texto que não se ocupa de debater ideias, mas antes se mostra como mero instrumento de ataque, é algo difícil. Difícil porque, ao avaliar o grau das ofensas escritas pelo seu autor, surge sempre a dúvida: ofende porque não conhece ou por pura má-fé? Por não conhecer o tema tratado ou por fazer pouco caso dos argumentos em debate e preferir o dissimulado ad hominem de aplausos fáceis?

Deixamos a nosso leitor a tarefa de responder por si só a essas perguntas.

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3 Comentários
  1. Alda Zaidan

    fevereiro 24, 2014

    Meus pêsames a revista Veja por contar com um profissional tão desinformado.

  2. Elaine Maria Luz

    fevereiro 24, 2014

    Qualquer pessoa em sã consciência consegue ver que o Reinaldo Azevedo mais parece o arquétipo do “pombo enxadrista”. Sempre desconfiei de pessoas que ao invés de se ater a uma discussão pelo seu conteúdo, preferem atacar seu argumentador. É o sinal de está buscando, em verdade, suprir de alguma forma a ausência de argumentos. É a já velha “quem não tem argumento ataca o argumentador”.

  3. márcio

    fevereiro 24, 2014

    Bom, a Veja é financiada por dinheiro público para fazer um jornalismo de duvidosa credibilidade. Ou melhor, para fazer as vezes de um partido político.

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